UM BALANÇO LARGAMENTE POSITIVO
I ENCONTRO NACIONAL DO COLECTIVO FESAL-PORTUGAL
por Manuel Baptista
Parede, 18/12/2005
O I Encontro do nosso Colectivo Nacional foi preparado e realizado, pela nossa organização recém-nascida, com especial destaque para os Companheiros e Companheiras da Guarda, com participação activa do Porto, de Tomar e de Lisboa.
Conseguiu-se assegurar um local digno (auditório do Paço da Cultura da Guarda) e organizar eficazmente a informação em torno do acontecimento, o que fez com que órgãos de comunicação social escrita e radiofónica estivessem presentes.
O desfile e concerto de gaita-de-foles e de tambores tradicionais foi realizado num intervalo do Encontro, convivendo com um grupo folclórico que fazia no átrio do Museu da Guarda uma apresentação de cantares natalícios.
No próprio Encontro, apesar de alguns atrasos, conseguiu-se cumprir a ordem de trabalhos.
Os momentos de convívio – o jantar, seguido de festa no bar Zincos - foram ocasião de se conhecerem melhor os participantes e de outros, que não puderam estar no Encontro, por este ou aquele impedimento, mas que tinham desejo de trocar impressões e conviver connosco.
As resoluções [ver anexo 1], são bastante significativas e abrem o terreno para uma melhor definição do projecto FESAL em Portugal.
Houve um debate sobre o sindicalismo no Século XXI [ver introdução ao debate no anexo 2] e outro sobre precariedade na sociedade e no trabalho, ambos com uma pequena introdução da nossa parte. Os dois debates que se seguiram, sobre as temáticas acima referidas, foram participados e interessantes, permitindo construir e reforçar consensos entre os membros da FESAL.
No próprio Encontro, decidiu-se começar a dar cumprimento ao ponto 4 da Proposta de Organização aprovada [ver anexo 1], visto haver pessoas dispostas a constituir parte da Comissão Coordenadora, comissão que deverá funcionar até ao próximo Encontro, tendo sido mandatadas/os pela Assembleia, as Companheiras Maria e Luísa do Porto, o Companheiro João G. Medeiros da Guarda, e eu próprio, Manuel Baptista, de Lisboa. Espera-se que o Núcleo de Base de Tomar também mandate pessoas e que os Núcleos de Lisboa e Guarda tenham outros elementos na Comissão Coordenadora, mais um por cada Núcleo de Base.
Pelas 19:00 houve uma conferência de imprensa. Guardámos recortes da imprensa regional que cobriu o acontecimento e sabemos quais as rádios que nos entrevistaram e transmitiram excertos das entrevistas.
Penso que o balanço é positivo, embora os resultados práticos das resoluções aprovadas se devam construir ao longo do ano que vem; fundamentalmente, as tarefas de nos organizarmos para a luta, desde o nível local, ao europeu.
A nossa participação no 1º Congresso Europeu da FESAL (Locarno, Abril de 2006), será importante, deve ser entendida por nós como apoio e reconhecimento explícito a sindicalistas anti-capitalistas e anti-autoritários de Portugal, por parte das organizações de Espanha, França, Itália, Holanda, Noruega, Eslovénia, membros da FESAL e que somam dezenas de milhares de membros.
Somos portadores de uma outra concepção de sindicalismo, mas também de vida, de sociedade. Quando dizemos que a FESAL se insere nas correntes sindicais alternativas, é enquanto alternativa ao capitalismo e ao modo de organização autoritário (vertical e burocrático).
Anexo1
PROPOSTA* AO PRIMEIRO ENCONTRO FESAL-E DE PORTUGAL
(Guarda 10-12-05)
[*Aprovada por consenso dos participantes ao referido Encontro]
1- O nosso Colectivo tem sido desde a sua fundação em 8 de Maio de 2005, em Lisboa, único para o espaço nacional e descentralizado. A assembleia Geral, quer ocorre aquando de cada Encontro Nacional, pelo menos uma vez ao ano, é a instância máxima, onde se tomam as orientações gerais e se define, na medida do possível, a nossa posição nas lutas sociais e laborais e o programa da organização.
2- Cada Núcleo de Base (NB) agrupa todos os membros do Colectivo português da FESAL-E que se encontrem na mesma cidade ou região; os docentes e os outros trabalhadores da educação, os estudantes, os encarregados de educação.
3- O Colectivo português da FESAL-E, portador de outra visão do sindicalismo em
relação à que domina actualmente nos sindicatos deste País, irá encetar o
caminho que leve a seu reconhecimento oficial como sindicato do sector
educativo.
4- Cada Núcleo de Base deverá escolher dois elementos de ligação que formarão
uma comissão coordenadora (até ao próximo Encontro Nacional) para dar
cumprimento às decisões deste Encontro Nacional.
5- Propõe-se a realização do 2º Encontro nacional em Lisboa, no 1º de Dezembro,
com data sujeita a alterações.
Anexo 2
ao Iº ENCONTRO NACIONAL DA FESAL-PORTUGAL
A 10 DEZ. 2005, GUARDA
Aqui não irei fazer um historial do que foi o sindicalismo ao longo de quase dois séculos, sindicalismo associado com a afirmação do proletariado como classe independente e antagónica da classe possuidora dos meios de produção, a burguesia.
Esta temática histórica e teórica, é perfeitamente legítima como objecto de estudo, de discussão e debate, mas não o seria para esta ocasião.
Com efeito, este Iº Encontro é, antes de mais, uma primeira oportunidade para nos conhecermos, para partilharmos as nossas preocupações e os nossos desejos relativamente ao concreto social de hoje e portanto ao projecto do nosso colectivo enquanto alternativa verdadeira, quer em termos organizativos, quer em relação a projectos concretos de trabalho.
Eu venho aqui, como qualquer outro membro, partilhar convosco as minhas reflexões, inquietações, desejos e esperanças.
Seleccionei quatro domínios ou características contrastantes que marcam globalmente um determinado estilo de sindicalismo. Poderia ter seleccionado outras, mas experiência diz-me que estas acabam por ser definidoras das restantes.
Prefiro, antes de mais nada, exprimir-me com total franqueza em relação ao tema em debate: de acordo com a minha visão, o sindicalismo em Portugal não existe!
Pois eu considero o sindicalismo, uma prática qualitativamente diferente da luta político partidária: ora isso, por mais voltas que se dê, tem sido um conceito ausente na prática dos activistas supostamente sindicais, sobretudo dos dirigentes, que na verdade, cumulam esse “activismo” com uma filiação política, ou uma forte simpatia pelo partido político A ou B ou C.
As pessoas, estejam nos cargos menos prestigiosos de delegados sindicais ou nos de membros de direcções sindicais, federais ou confederais, vêm demasiadas vezes o âmbito como meio de ganhar mais trunfos na arena político, sobretudo, política interna de seus partidos respectivos.
Este modelo, que tem vigorado de forma praticamente total no panorama sindical do nosso país, é responsável pelo estado crítico a que se chegou de fraqueza, nas lutas laborais, de isolamento e de incapacidade de resposta, concreta dos trabalhadores. Este panorama é um bocado aberrante em comparação a vários países europeus; países onde existem minorias sindicais, não vinculadas a partidos, quer como tendências organizadas nos sindicatos “convencionais” (aderentes à CES, Confederação Europeia Sindical), quer em sindicatos autónomos, independentes, com uma filosofia de base, anti-capitalista e anti-autoritária.
A questão a colocar quanto aos partidos, na minha perspectiva, não é a de “permitir-se ou não” que alguém, membro de um partido político, seja membro do sindicato; claro que sim, que essa pessoa não deverá ser excluída, desde que se comprometa explicitamente a defender os estatutos do sindicato e acate as suas resoluções. Já quanto à pertença simultânea em funções de direcção de sindicatos e em estruturas políticas (sejam elas partidárias ou não) é fortemente questionável tal legitimidade: isto, para a salvaguarda da independência do movimento sindical. Com efeito, não se deve tolerar que alguém se sirva de um cargo sindical, para a estar na política, como aqui – em Portugal- é tão corriqueiro observar-se!
Note-se que esta posição não é “a-política”, mas é antes por outra visão política, num sentido amplo do termo, do papel dos sindicatos: não podemos senão denunciar e combater as correntes que viram/vêem os sindicatos como meras “correias de transmissão” do partido. Os sindicatos tornaram-se “capas” cómodas, para partidos, em geral, ditos de “esquerda”, manobrarem as “massas”. Mas essas massas, são pessoas, são indivíduos, que eles desprezam, no fundo.
A segunda questão que se deve considerar é pois esta: o sindicalismo passivo ou activo: o ser humano que, neste caso particular, está inscrito no sindicato. Deve ser activo/a? E como?
A meu ver, o membro de um sindicato, deve ser activo/a, no seu meio, deve naturalmente se implicar, se auto-implicar nas discussões e nas tomadas de decisões.
As assembleias devem tornar-se as instâncias de decisão verdadeira, onde os membros do sindicato, não são APENAS “consultadas”, mas muito mais do que isso: a assembleia é o local onde se constróem consensos para a acção.
Não serve aqui a lógica da “maioria e da minoria”, pois se o nosso lema é efectivamente “um por todos e todos por um”, então ouvimos e ponderamos sempre, com respeito e seriedade devidos, não com hostilidade, aquilo que A ou B ou C tem para dizer. Para este tipo de sindicalismo assembleário ser operacional é necessário que os intervenientes nas assembleias aprendam a autodisciplina, a saberem intervir de acordo com as regras das assembleias e com respeito pelas decisões colectivas tomadas previamente, ou seja, o sindicato é uma ‘escola’ de DEMOCRACIA.
A terceira questão que eu queria colocar era a da noção de federalismo; como toda a gente sabe, é muito difícil dar (e perceber) uma panorâmica verdadeiramente esclarecedora daquilo que se passa numa dada terra, num dado sector de actividade, etc. se estamos longe, se não partilhamos o quotidiano desse lugar ou sector.
Logicamente então, quem se vai implicar directamente numa actividade ou numa luta, é que decide em primeira instância, se a vai realizar ou não, e se sim, em que moldes. É, sem dúvida, uma questão de respeito pela dignidade das pessoas e activistas, directamente envolvidas nesse local ou sector de actividade, mas também...por uma questão de eficácia.
Temos de reconhecer-lhes autonomia das decisões que a elas digam respeito, enquanto pessoas inseridas em colectivos locais ou de sector. Isto envolve uma responsabilidade correlativa. Terem chegado à conclusão prévia que tais iniciativas estão de acordo com os princípios gerais do nosso colectivo, ao nível nacional e também, de acordo com as orientações concretas tomadas pela assembleia geral nacional. Por outro lado, cada núcleo e grupo, e indivíduo deverá estar consciente que deve comprometer-se activamente em solidariedade com as iniciativas dos outros núcleos.
Finalmente, como quarta e última questão, gostamos todos de falar em solidariedade, porém há palavras que são esvaziadas de sentido por serem usadas a torto e a direito sem verdadeiramente se ter um noção clara do que se está a falar.
A solidariedade é entre-ajuda, é ajuda mútua, é sermos capazes de fazer (FAZER!) algo por outrém, não de dizer apenas (DIZER, PROCLAMAR!). Confunde-se muito proferir ou escrever palavras bonitas com solidariedade: quem precisa de solidariedade, não precisa de palavras bonitas, precisa de coisas concretas; seja de dinheiro, ou apoio jurídico (advogados), ou pressões colectivas (concentrações ou manifs. por exemplo), etc. tudo coisas que tenham como resultado fortalecer NO CONCRETO, aqueles ou aquelas com os/as quais estamos solidários e a enfraquecer, se possível, a outra parte (em geral, o patronato e/ou o Estado).
O sindicalismo para o século XXI, terá de ser muitas coisas mais, e coisas extremamente importantes que eu não referi aqui, porque vamos ter oportunidade de falar delas noutros pontos da agenda deste Encontro: mas parece-me INDISPENSÁVEL que ele seja, verdadeiramente:
APARTIDÁRIO, DE BASE / ASSEMBLEÁRIO, FEDERALISTA, SOLIDÁRIO